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Depois de muita porta na cara, Dudu criou um festival cultural na raça

Publicado em 14/04/2025 07:13

Em 2013, as portas se fecharam para o ator, músico e produtor cultural Eduardo Miranda — ou melhor, nem chegaram a se abrir. Mas, apesar de dar de cara com elas trancadas, ele conseguiu enxergar janelas. Mesmo com dificuldades, nascia ali, na Praça do Rádio Clube, o festival Expressão de Rua. Hoje, depois de 10 edições, ele se emociona ao falar sobre como é resistir para fazer arte na raça e, principalmente, continuar acreditando no projeto que é a vida dele.

Há 18 anos, ele se inscreve em editais públicos, mas nunca foi contemplado. Para mostrar que a arte existe além da burocracia, ele criou o evento, que no começo não tinha sequer caixa de som. O objetivo é acolher os artistas que, assim como ele, não têm espaço na cena. Desta vez, o festival aconteceu na Plataforma Cultural.

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"A rejeição faz a gente tomar algumas atitudes. Ver as portas batendo a todo momento na nossa cara faz com que a gente ative o nosso poder, nosso sensor criativo, e vá à luta em vez de ficar reclamando. Foi isso que a gente fez: pegamos tudo isso, transformamos em energia, e deu resultado. Esse festival tem história."

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Sobre as dificuldades, ele ressalta que muitos não acreditavam no sonho de fazer vingar um festival feito com o cotidiano dele: pessoas do rap, funk, grafiteiros. Ele conta que, no passado, foi julgado e chamavam de louco.

“Eu acho que, de certa forma, eu era um pouco. Porque seria muito fácil eles fazerem o que eles queriam com a gente. Acharam que eu iria ficar quieto lá no canto. Pegar as sobras. Eu me recusei. Me emocionou muito, foram 10 anos eu pegando o ônibus, levando ofício para cima e para baixo e nada. Até hoje eu ainda vivo das minhas pulseiras na rua, vendendo meus artesanatos. Então, esse festival não foge da minha realidade. Alguém tinha que acreditar. O Carlinho faz valer a pena esses 10 anos.”

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Ele se refere a Carlos Porto, produtor cultural e diretor de eventos culturais e esportivos. Foi ele que ajudou  Dudu como é conhecido, na empreitada do festival. Ele conta que manter a ideia de uma coisa assim por tanto tempo e sustentar ela exige ousadia. E que, para o povo preto, as coisas demoram a acontecer.

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“A vida sempre foi mais difícil. É um embate que a vida nos coloca todos os dias. É a sua aparência, você é questionado por várias questões: será que você tem conhecimento, capacidade técnica, operacional, intelectual, será que você vai ser um bom gestor? Então, a ousadia de fazer incomoda muita gente. É um festival que tem dez anos, o Dudu é diretor e mantém a ousadia. A trajetória dele é a do festival, é a história do dia a dia dele”.

Carlos explica que se aliou a Eduardo para fazer a gestão do projeto e captação dos recursos necessários para a realização ao longo dos anos. Este é o maior evento em comemoração às 10 edições.

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“Tudo isso faz uma referência dessa identidade que a gente tem. Enquanto homens pretos e mulheres pretas, músicos pretos, trabalhadores da cultura, criando essa referência dessa identidade. Desde a apresentadora, que é a Romilda, até os músicos que estão fazendo. Isso não é exclusão, é uma inclusão dessas pessoas que foram excluídas há muito tempo de todo esse processo.”

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Quem apresentou o festival foi Romilda Pizani. Para ela, enquanto mulher negra atuante na cena, o evento serve para fortalecer a cultura local. “Estamos resistindo a essa cultura que é imposta, que é a não valorização do que é social. Trazendo exatamente o que nós temos. É importante e necessário. A sociedade pode se ver, se reconhecer e se apropriar”.

Uma das cantoras da festa foi Bernarda Ferreira, ou Black Bee, como é conhecida. Ela é vocalista do projeto To’kaya e já participou de 7 edições do festival. Embora esteja há tanto tempo junto do produtor Eduardo, este ano foi o mais significativo para a artista.

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“Ele conseguiu unir toda a cena, os artistas. Isso é difícil. O pessoal gosta do que vem de fora. Sempre são melhores para eles do que a gente. Tem muita coisa legal aqui. Por mais que tenha coisas que fortalecem a periferia, ainda é bem pequeno. Por que a gente não merece cachê, espaço, um palco bonito? Moro perto das Moreninhas, no Alves Pereira, e ali não tem esses rolês quase”.

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O DJ Bruno dos Santos, ou DJ TGB, conta que se apresentou e levou dois novos artistas para o palco. “São 10 anos de Expressão de Rua. Família, essa aqui é a resistência. Festival lindo, máximo respeito. Campo Grande tem uma cultura maravilhosa, linda e pesada", disse.

Também DJ, Lara Naja assistia ao show do gramado da Plataforma Cultural. Para ela, o festival valoriza os artistas que muitas vezes não são lembrados.

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“É importante para os artistas, para a cultura, para enaltecer esses que são esquecidos. E ali, fazendo na raça, eu sei bem. Também sou produtora cultural e sei quanto é difícil fazer com que a gente consiga um espaço".

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A Cigana Luna Negra acrescentou que a luta cigana e negra se aproxima por precisarem mostrar que elas existem. Ela é amiga do idealizador do festival, mas participou pela primeira vez.

“Esse ano o destino cigano nos juntou. A gente tinha programado coisas próximas e acabou caindo na mesma data. A gente resolveu se juntar e trazer a comunidade cigana pra dentro, porque tem tudo a ver. Isso tá sendo muito rico. Estamos trazendo a nossa cultura, integrando e debatendo preconceitos. Discutindo o porquê as portas são tão fechadas para nós”.

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Quem também subiu no palco do festival foi a cantora Luciana Vilharva, vocalista do grupo Samba do Caramelo. Essa foi a primeira participação dela no Expressão de Rua.

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“É importante, tanto para a gente quanto para as crianças que sempre estão aqui. Isso abre muito espaço, é muito importante a gente celebrar a cultura negra, cultura afro, e o samba também faz parte disso.”

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